Reflexões sobre carreiras

Recentemente, li um texto que me chamou a atenção “Seu declínio profissional está chegando (muito) mais cedo do que você pensa”, um ensaio no The Atlantic do cientista social e autor Arthur C. Brooks. O ensaio de Brooks é uma reflexão pessoal sobre carreiras profissionais. Em particular, o ensaio explica por que em julho de 2019, aos 55 anos, ele concluiu que era hora de renunciar ao seu cargo de décadas como presidente do American Enterprise Institute (AEI) para ingressar no corpo docente da Harvard Kennedy School . O ensaio de Brooks é intrigante, pois traz uma reflexão sobre os estágios posteriores da carreira; – que se confunde, as vezes, com a carreira de outras pessoas.

Recentemente, comecei em um novo desafio, nesta fase mais sênior da minha carreira, quando decidi também passar a escrever o blog semanal fluência.digital e investir em desenvolvimento de aplicativos moveis.

O ensaio de Brooks faz referência ao trabalho de Dean Simonton, professor emérito de psicologia na UC Davis, que realizou extensa pesquisa sobre as trajetórias de carreiras criativas e é um dos maiores especialistas do mundo neste assunto.

Ao longo dos anos, Simonton desenvolveu um modelo matemático que explica as variações de longo prazo nas trajetórias de carreira de diferentes indivíduos, bem como as diferenças nas trajetórias de carreira entre disciplinas e domínios. Alguns parâmetros são responsáveis pela maioria das diferenças individuais: a idade em que a carreira começa, o potencial criativo no inicio da carreira, a quantidade de novas ideias geradas e a quantidade de ideias que se tornam resultados finais como publicações ou produtos. Este modelo pode então prever a trajetória da carreira de cada indivíduo, incluindo o começo ou o princípio da carreira, o meio e as contribuições finais. Simonton confirmou a validade de seu modelo analisando a produção criativa das carreiras de mais de 2.000 cientistas e inventores, bem como músicos, pintores, autores e outros artistas.

“Há muito sucesso e aumento de produtividade nos primeiros 20 anos após o início da carreira, em média”, escreveu Brooks resumindo os resultados de Simonton. “Portanto, se você começar uma carreira a sério aos 30 anos, espere fazer seu melhor trabalho por volta dos 50 e entrar em declínio logo depois disso. O momento específico de pico e declínio varia um pouco dependendo do campo”.

Outra pesquisa descobriu que a probabilidade de uma grande descoberta por cientistas e investidores é muito maior por volta dos 20 e 30 anos, e depois diminui até os 40, 50 e 60 anos. Embora existam discrepâncias, “a probabilidade de produzir uma grande inovação aos 70 anos é aproximadamente a mesma que era antes dos 20 anos – quase inexistente”.

A realização literária segue um padrão semelhante. Os poetas atingem o auge aos 40 anos, enquanto os romancistas geralmente demoram mais. É provável que os autores alcancem os primeiros lugares na lista dos mais vendidos de ficção do NY Times entre 40 e 50 anos. Alguns romancistas têm se mostrado produtivos até a velhice, mas as chances de escrever um best-seller diminuem rapidamente depois dos 70.

“Depois de ganhar fama e fortuna aos 20 anos, muitos empreendedores de tecnologia estão em declínio criativo aos 30 anos”, observou Brooks. “Em 2014, a Harvard Business Review relatou que os fundadores de empresas avaliadas em US $ 1 bilhão ou mais, tendem a se agrupar na faixa de 20 a 34 anos. Em resumo, acrescenta ele, “se a sua profissão exige velocidade de processamento mental ou capacidades analíticas significativas – o tipo de profissão que a maioria dos formandos da faculdade ocupa – um declínio perceptível provavelmente ocorrerá mais cedo do que você imagina. Desculpa.”

Por que isso acontece?

Uma resposta provável está na pesquisa do psicólogo Raymond Cattell, que na década de 1940 introduziu os conceitos de inteligência fluida e cristalizada. A inteligência fluida é a capacidade de aprender rapidamente novas habilidades, se adaptar a novos ambientes e resolver novos problemas de raciocínio. Requer considerável poder de processamento bruto, que geralmente atinge o pico em nossos 20 anos e isso diminue lá pelos 30 e 40 anos.

A inteligência cristalizada, por outro lado, é o know-how e a expertise que acumulamos ao longo de décadas. É a capacidade de usar os estoques de conhecimento e experiências adquiridas no passado. Geralmente aumenta até os 40 anos, atinge o pico aos 50 e não diminui até o final da vida.

O momento específico de pico e declínio varia dependendo da carreira. Carreiras baseadas principalmente na inteligência fluida tendem a atingir o pico mais cedo, enquanto aquelas mais baseadas na inteligência cristalizada atingem o pico mais tarde. Simonton descobriu que os poetas, – um empreendimento altamente criativo e fluido, – geralmente produziram metade de sua produção criativa por volta dos 40 anos. Os historiadores, por outro lado, – que confiam em seu estoque cristalizado de conhecimento – não alcançam esse marco até próximo de 60. Os cientistas podem produzir suas principais pesquisas no final dos 30 anos, mas geralmente permanecem grandes professores, mentores e administradores até bem mais tarde na vida, graças ao seu conhecimento e experiência acumulados. E, embora os empreendedores normalmente alcancem o pico e diminuam bastante jovens, CEOs e gerentes gerais – profissões que exigem o conhecimento, compreensão e sabedoria associados à inteligência cristalizada – alcançam seus anos mais produtivos significativamente mais tarde.

Na adolescência e na casa dos 20 anos, Brooks seguiu carreira como trompista. Mas, em 1995, aos 31 anos, ele abandonou o que chamou de sua “carreira musical vacilante” para fazer o doutorado em políticas públicas. Depois de se formar em 1998, teve uma carreira de sucesso como professor universitário, primeiro na Georgia State University, depois em Syracuse. Em 2009, ele foi nomeado presidente do American Enterprise Institute.

Em 2015, logo após seu 51º aniversário, Brooks disse

“minha vida profissional ia muito bem. Eu era o presidente de um próspero think tank de Washington … Escrevi alguns livros best-sellers. As pessoas assistiram aos meus discursos. Minhas colunas foram publicadas no The New York Times.”

“Mas eu comecei a me perguntar: Será que posso mesmo continuar assim? Eu trabalho como um louco. Mesmo se eu ficasse nisso 12 horas por dia, sete dias por semana, em algum momento minha carreira iria desacelerar e parar. E quando isso acontecesse, o que eu ia fazer? … Então, nos últimos quatro anos, estive em uma busca para descobrir como transformar meu eventual declínio profissional de uma questão de pavor, em uma oportunidade de progresso … Comecei minha pesquisa com o objetivo de produzir um roteiro tangível para me guiar durante os anos restantes de minha vida. Isso resultou em quatro compromissos específicos.”

Saltar. “O maior erro que as pessoas de sucesso profissional cometem é tentar sustentar indefinidamente as realizações máximas, tentando fazer uso do tipo de inteligência fluida que começa a desaparecer relativamente cedo na vida. Isso é impossível … Então: eu renunciei [saltei] ao meu cargo como presidente do American Enterprise Institute, a partir do momento em que este ensaio foi publicado.”

Servir. “O tempo é limitado e a ambição profissional exclui coisas que, em última análise, importam mais … Felizmente, um esforço para servir aos outros pode aproveitar nossos pontos fortes à medida que envelhecemos … Estou, portanto, entrando em uma fase da minha carreira na qual posso me dedicar a compartilhar ideias a serviço de outros, principalmente ensinando em uma universidade. Minha esperança é que meus anos mais frutíferos estejam à frente.”

Adoração. “Recomendo fortemente que cada pessoa explore seu lado espiritual – pretendo dedicar uma boa parte do resto da minha vida à prática da minha própria fé, o catolicismo romano. Isso não é incompatível com o trabalho; pelo contrário, se pudermos nos desligar dos apegos mundanos e redirecionar nossos esforços para o enriquecimento e ensino de outros, o próprio trabalho pode se tornar uma busca transcendental.”

Conectar. “Ao longo deste ensaio, concentrei-me no efeito que a diminuição dos meus feitos de trabalho terão sobre minha felicidade. Mas uma abundância de pesquisas sugere fortemente que a felicidade – não apenas nos anos posteriores, mas ao longo da vida – está diretamente ligada à saúde e abundância dos relacionamentos. Tirar o trabalho de sua posição de preeminência – mais cedo ou mais tarde – para abrir espaço para relacionamentos mais profundos pode fornecer um baluarte contra a angústia do declínio profissional.”

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